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Nossas Raízes

Imagine uma cidade onde em todos os espaços o aprendizado é possível. Imagine cada quintal sendo parte do espaço educacional. Imagine cada família integrada e envolvida na educação de seus filhos. Imagine um espaço educacional onde pais e cuidadores podem trazer suas experiências e transformar coisa de adulto em aprendizado para as crianças.

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A experiência que trazemos para o blog hoje é inovadora não só por deixar as crianças subirem em arvores e se sujar, mas porque ela não tem espaço físico fixo. Aqui o aprendizado pode acontecer no quintal de uma das crianças, na trilha, numa árvore, a beira do rio, dentro de uma sala. Não existe espaço físico próprio para o aprendizado, pois a criança faz parte do mundo e é neste mundo que ela vive e deve ser neste mundo seu espaço de aprender.


Mas, antes de falar da magia desse projeto, tudo que ele desperta e representa para todos nós, eu gostaria de dar uma passeada no contexto local no qual ele surgiu.


O Espaço Nossas Raízes fica em Lençóis – BA no coração da Chapada Diamantina, lugar de exuberante beleza natural, com pouco mais de 10mil habitantes. Ficou mundialmente conhecida a partir da novela gravada na região no início dos anos 90, o que atraiu muitos forasteiros (estrangeiros e brasileiros) com desejo de explorar o turismo, mudar o ritmo de vida, criar filhos num lugar mais tranquilo entre outros.


Então, essas pessoas, a maioria com nível superior, de classe média e com formação diferente da oferecida nessa cidade, encontra aqui uma dificuldade: a educação. Onde meus filhos vão estudar? Que tipo de formação eles vão ter? Esses questionamentos são terreno fértil para o surgimento de muitas iniciativas, e assim surgiu a Cata Vento, escola Waldorf que funcionou em Lençóis, mas fechou depois de muitos problemas estruturais, muitas ONGs e associações que visam atender os anseios educacionais, ambientais e de outras ordens existentes na cidade.


As escolas existentes, tanto as privadas quanto as públicas não atendem as necessidades desse grupo; a cidade já teve uma escola alternativa, mas, como já foi dito, não funcionava mais. Então, duas mães, Raquel Freitas e Michele Freitas, começaram a realizar oficinas de arte para crianças em suas próprias casas. Ao mesmo tempo surgia um grupo de mães na cidade, com ideais de educação livre/alternativa, soma-se a esse caldeirão uma professora da escola privada com sede de mudança. Assim, ocorreu o casamento de ideias e ideologias em busca de uma educação diferenciada.


Quero deixar claro aqui que o contexto do termo “diferenciada” apresentado por este projeto não está pautado numa educação que seja melhor do que é apresentado nas escolas públicas e privadas da cidade. É neste ponto que o leitor se pergunta: Como assim diferenciada não tem a ver com melhor? O projeto não visa uma educação melhor para as crianças?


Não queremos algo melhor do que existe, porque isso seria apenas uma versão diferente do que já está ai, no fundo seria a mesma coisa com outra roupa e isso já está bem representado pela dupla escola pública e escola privada: idênticas em suas ideologias. Precisamos de novos paradigmas, de quebrar barreiras, dar voz as crianças, entender o que elas precisam e dar suporte aos seus anseios, suas curiosidades, suas descobertas.


Neste contexto, nasce o Nossas Raízes – Arte, Cultura e Educação. Funciona na casa de Raquel e de Michele há dois anos, sendo o primeiro ano só com as oficinas de artes e o segundo ano com as turmas que serão apresentadas a seguir.

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Inicialmente a ideia era ocupar espaços existentes na cidade, não ter sede fixa. Uma não escola sem espaço físico. A ideia de ocupar os espaços, de transformar a cidade em espaço de aprendizado ainda é norteadora, porém com o crescimento do projeto a necessidade de uma sede fixa é urgente.


A mensalidade cobre gastos com limpeza, material didático, as três tutoras (Raquel, Michele e Vanessa), entre outros. Existem os alunos bolsistas, mas as bolsas ocorrem no sistema de troca (como no meu caso) onde o pai presta algum serviço enquanto os filhos participam do projeto.


Os pais, mesmo os que prestam serviços no sistema de troca, devem participar das atividades num sistema de rodízio que está sendo estabelecido. Essa ideia visa à participação ativa dos pais na educação dos filhos, articulando a prática do projeto com a vivência em casa.


Fortalecendo a ideia de que a educação não é feita no espaço destinado a isso fora do lar, mas em conjunto e principalmente em casa e com a participação ativa dos pais. As bases pedagógicas norteadoras do projeto são muitas. As responsáveis seguem diversas linhas de educação alternativa centrada na valorização da capacidade inata das crianças.


Através da livre expressão, do respeito ao limite e do tempo de cada um, valorizando atividades corporais e lúdicas, permitindo a livre expressão da imaginação e criando ambiente propício para se criar livremente um paralelo entre o lúdico e o real, propiciando aprendizado sobre a vida cotidiana e fortalecendo o indivíduo emocionalmente.

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Acreditando que a construção de uma sociedade melhor está intimamente ligada á educação de indivíduos pensantes, críticos, livres, empáticos e seguros. É na autoexpressão, na compreensão das próprias emoções, na relação com os outros, na percepção da emoção alheia, no altruísmo, no contato com a natureza e no respeito à mesma que permitimos a cada criança a construção de sua identidade.


Aprender é algo inato, instintivo, está no DNA. Somos extremamente capazes de descobrir, destrinchar, entender e resignificar o que se apresenta e desperta nossa curiosidade. O papel do adulto é tão somente observar, orientar e principalmente deixar que a criança interior conviva com as crianças ao seu redor e possa aprender com um novo olhar. Se permitir redescobrir o mundo sob a ótica infantil e ajudar os pequenos na descoberta das suas potencialidades.


Aqui se acredita na necessidade de se sujar, subir e descer. Não só de terrenos planos é feito o mundo, é preciso entender nosso corpo andando na corda bamba, tropeçar e conseguir se equilibrar sem cair, cair e perceber os limites do meu corpo. A criança não é, dentro dessa ótica, mero papel em branco a ser preenchido com conhecimento adquiridos por outros. Ela é agente na construção da sua estória, na manifestação dos seus desejos, anseios e aptidões.


Em três momentos diferentes crianças a partir de 3 anos são reunidas para exercitar o ser, estar, escolher e conviver. Assim, o aprendizado, a experimentação, o autoconhecimento, desenvolvimento motriz e cognitivo, a confiança em si e no outro, a descoberta da liberdade através de “com-vivências”, é possibilitado.


Os três momentos são separados por uma temática especifica que dialoga com as necessidades intrínsecas da faixa etária de cada grupo. Assim, crianças de 3 a 5 anos se reúnem todas as manhãs sob a temática “Brincar e Compartilhar”. Esse primeiro grupo, inicialmente só receberia crianças a partir dos 3 anos, porém a procura dos pais de crianças menores foi grande e abriu espaço para crianças a partir de 1 ano que já andem.


O segundo grupo são de crianças de 6 a 8 anos, se reúnem duas vezes por semana para oficinas de arte com a temática “Criar e Experimentar”. As crianças de 9 a 14 anos também se reúnem duas vezes por semana com a temática “Quem Somo e Onde Estamos”. Muitas das crianças do grupo de crianças maiores, 6 a 14 anos, realizam atividades complementares a escola, visando o exercício da liberdade de criação e expressão ausentes, hoje, nos modelos escolares tradicionais.

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Ainda existe o desejo e a demanda de realizar muitas coisas. O grupo agora pretende se institucionalizar afim de captar recursos e permitir a realização do sonho de abrir as portas para crianças carentes. Existe também a necessidade de se regulamentar como instituição de ensino credenciada, para assim dar maior segurança para os pais das crianças em idade escolar obrigatório por lei.


O Nossas Raízes, desta forma, entra no cenário educacional de Lençóis oferecendo uma educação livre, que valoriza a criatividade, a brincadeira e o desenvolvimento de valores como amizade e o cuidado mutuo. Supre, nesse contexto, a necessidade local por uma educação que valoriza o indivíduo como um todo. Esse é o sonho transformado em realidade é o desejo de educar livremente e permitir que cada criança se expresse e descubra o mundo ao seu redor sendo criança.

Débora Daltro Lençóis, 29 de agosto de 2014.

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